
Com a proximidade das comemorações do “Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas”, no próximo dia 10 de junho, vale a pena falar neste espaço da influência árabe no nosso idioma.
Com efeito, no ano de 711, tropas muçulmanas compostas por berberes e árabes, lideradas por Tariq ibn Ziyad, atravessaram o Estreito de Gibraltar e invadiram a Península Ibérica, derrotando o rei visigodo Rodrigo. Essa invasão marcou o início da ocupação islâmica na região, que aria a ser chamada de Al-Andalus.
A presença árabe não foi uniforme ao longo da península. Enquanto o Sul (atual Andaluzia, na Espanha) permaneceu sob forte influência muçulmana por séculos, o norte da Península resistiu mais cedo e se tornou o berço da Reconquista Cristã – um processo longo de retomada dos territórios pelos reinos cristãos.
Durante os cerca de 800 anos de ocupação parcial da Península Ibérica, a convivência entre cristãos, judeus e muçulmanos gerou uma rica troca cultural, científica e linguística. Esse período é conhecido por alguns estudiosos como uma época de relativa convivência pacífica entre as três religiões, especialmente em cidades multiculturais como Córdoba, Toledo e Sevilha.
Foi nesse ambiente que os povos ibéricos, mesmo os que viviam sob domínio cristão, absorveram conhecimentos árabes nas áreas de matemática, astronomia, medicina, filosofia, agricultura e linguística. Como o árabe era a língua da istração, da ciência e da cultura, muitas palavras árabes foram adotadas e adaptadas ao romance ibérico falado pelos cristãos.
Muitos termos portugueses derivam do árabe, especialmente substantivos iniciados com "Al", como Alcântara e Almeida. Palavras com "x" (Xadrez, Xarope) e "enx" (Enxaqueca, Enxofre) também têm origem árabe. Algumas letras árabes foram adaptadas, como o "h" transformado em "f" (Alfama, Alface). A influência se estende a topônimos, como Algarve (o Ocidente) e Odemira (rio da princesa), e a nomes próprios, como Leonor (que vem da luz) e Fátima.
Setores como agricultura (Azeite, Alfazema), construção (Azulejo, Alcáçova), istração (Alcaide, Aldeia), e ciências exatas (Álgebra, Cifra) também incorporaram vocabulário árabe.
Com a tomada de Lisboa em 1147 e a conquista do Algarve em 1249, os árabes foram sendo gradualmente expulsos do território português. Ainda assim, a influência cultural e linguística permaneceu viva. Mesmo após a Reconquista, muitas comunidades mouriscas (muçulmanos convertidos ou tolerados) continuaram vivendo em Portugal por algum tempo, especialmente no sul. Com o tempo, seus costumes, técnicas e palavras foram se integrando definitivamente à cultura portuguesa.
A presença árabe na Península Ibérica não foi apenas uma ocupação militar ou religiosa: foi um longo período de intercâmbio cultural que deixou marcas profundas na identidade dos povos ibéricos, especialmente na língua. Por isso, a Língua Portuguesa carrega até hoje palavras, sons e conceitos originários do árabe, que testemunham uma das épocas mais ricas e complexas da história ibérica.
E, um país sem história é um país sem memória; é um país que dificilmente singra. Dia 10 de Junho é o “Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas” – o orgulho nacional dos portugueses.
(*) O autor é formado em História e Jornalismo desde 1985 nas áreas de Política, Social, Ciência e Tecnologia. Possui credenciamento profissional emitido pelos Estados Brasileiro e Português e é correspondente internacional para a União Europeia pela GNS - Internacional Press Association.